A palavra “demência” costuma causar medo imediato em pacientes e familiares, pois remete a doenças progressivas e irreversíveis, como o Alzheimer. No entanto, existem diversas condições médicas que podem provocar sintomas semelhantes, perda de memória, dificuldade de concentração, alterações de comportamento ou desorientação, sem se tratar de uma demência verdadeira. Identificar corretamente essas situações é fundamental, já que muitas delas são tratáveis e até reversíveis quando diagnosticadas a tempo.
Neste artigo, falaremos sobre algumas das principais condições que podem “imitar” a demência, com destaque para o hipotireoidismo, a encefalopatia hepática e os AVCs silenciosos, além de outras causas clínicas, neurológicas e psiquiátricas.
A demência é definida como um conjunto de sintomas cognitivos e comportamentais que interferem nas atividades de vida diária, geralmente progressivos e associados a doenças neurodegenerativas. Já os quadros que simulam demência apresentam manifestações parecidas, mas resultam de alterações metabólicas, infecciosas, psiquiátricas ou estruturais, muitas vezes reversíveis com tratamento adequado.
O desafio clínico está justamente em distinguir as causas degenerativas das condições potencialmente reversíveis, garantindo que o paciente receba o cuidado mais apropriado.
O hipotireoidismo é uma das causas clássicas de sintomas cognitivos semelhantes à demência. Quando a glândula tireoide produz hormônios em quantidade insuficiente, diversas funções do organismo ficam comprometidas, incluindo o metabolismo cerebral.
Lentificação do pensamento
Perda de memória recente
Dificuldade de concentração
Sonolência excessiva
Alterações de humor, como apatia ou depressão
Essas manifestações podem levar familiares a acreditar que se trata de um quadro demencial. Entretanto, um simples exame de sangue que avalia TSH e T4 livre confirma o diagnóstico.
Com o uso da reposição hormonal adequada (levotiroxina), a maioria dos sintomas desaparece, evidenciando a importância de considerar o hipotireoidismo no diagnóstico diferencial.
A encefalopatia hepática ocorre em pacientes com doença hepática crônica, especialmente cirrose, e resulta do acúmulo de toxinas, como a amônia, que não são metabolizadas pelo fígado e acabam afetando o sistema nervoso central.
Confusão mental
Desorientação temporal e espacial
Alterações de memória
Mudanças de personalidade
Sonolência ou agitação
Muitas vezes, o quadro pode surgir de forma flutuante, confundindo médicos e familiares.
O diagnóstico é clínico, apoiado por exames laboratoriais e história de doença hepática. O tratamento inclui medidas como uso de lactulose e antibióticos não absorvíveis (como a rifaximina) para reduzir a produção de amônia. Quando controlada, a encefalopatia pode regredir completamente, ao contrário das demências neurodegenerativas.
Nem todo acidente vascular cerebral (AVC) se manifesta de forma súbita e incapacitante. Os chamados AVCs silenciosos ocorrem sem sintomas evidentes, mas deixam pequenas lesões no cérebro que, somadas ao longo do tempo, podem comprometer a cognição.
Pequenos esquecimentos
Dificuldades em tarefas complexas
Alterações de humor ou apatia
Declínio intelectual gradual
Essas alterações são muitas vezes atribuídas ao envelhecimento natural, mas podem indicar demência vascular incipiente.
Hipertensão arterial
Diabetes mellitus
Dislipidemia
Tabagismo
Sedentarismo
O controle rigoroso dos fatores de risco cardiovascular é a principal forma de evitar os AVCs silenciosos. Quando diagnosticados precocemente em exames de imagem, é possível adotar medidas que retardam a progressão do comprometimento cognitivo.
Além dos exemplos citados, existem diversas outras situações que podem confundir o diagnóstico clínico:
A carência dessa vitamina pode gerar quadros de esquecimento, confusão mental e até alucinações. A suplementação adequada costuma reverter os sintomas.
Idosos deprimidos podem apresentar apatia, lentidão e perda de memória, sendo confundidos com pacientes com Alzheimer. O tratamento antidepressivo pode normalizar a cognição.
Infecções como sífilis terciária e HIV não tratado podem provocar comprometimento cognitivo, que melhora com a terapia adequada.
Apneia obstrutiva do sono causa sonolência diurna, falta de atenção e lapsos de memória, frequentemente confundidos com declínio demencial.
Certos fármacos, como benzodiazepínicos, anticolinérgicos e opioides, podem prejudicar a memória e simular demência, especialmente em idosos.
Caracterizada pela tríade: dificuldade para andar, incontinência urinária e perda de memória. Muitas vezes confundida com Alzheimer, mas pode ser tratada com derivação ventricular.
Identificar a verdadeira causa do déficit cognitivo exige uma avaliação médica criteriosa, que geralmente inclui: história clínica detalhada do paciente, exame físico e neurológico, exames laboratoriais, exames de imagem e avaliação neuropsicológica.
Esse processo garante que o paciente não seja rotulado de forma precoce com uma demência irreversível, quando na verdade apresenta uma condição tratável.
É natural que pacientes e familiares fiquem apreensivos diante de sintomas cognitivos. Contudo, é essencial compreender que nem todo esquecimento significa Alzheimer. Estima-se que até 10% dos casos de declínio cognitivo em idosos estejam relacionados a causas reversíveis.
Por isso, ao surgirem sinais como confusão, dificuldades de memória ou alterações de comportamento, a busca por atendimento médico deve ser imediata. Um diagnóstico correto pode transformar a vida do paciente, oferecendo tratamento eficaz e melhor qualidade de vida.
Diversas condições podem imitar a demência, como o hipotireoidismo, a encefalopatia hepática e os AVCs silenciosos, além de deficiências nutricionais, distúrbios do sono, depressão e efeitos colaterais de medicamentos. Enquanto as demências neurodegenerativas são progressivas e incuráveis, muitas dessas situações são reversíveis com diagnóstico e tratamento precoces.
Portanto, a mensagem essencial é: diante de sintomas de perda de memória ou alterações cognitivas, não tire conclusões precipitadas. Procure sempre uma avaliação médica completa. Muitas vezes, a “demência” pode não ser o que parece.
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